quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Educação vigiada

Por: Amanda Cieglinski.

Uso de câmeras já é realidade em muitas escolas brasileiras e seu objetivo varia de acordo com o nível de ensino

Na padaria, em um posto de gasolina, nas ruas, nos shoppings, nos bancos, em elevadores e até em hospitais. Não adianta tentar fugir delas: as câmeras de vigilância estão hoje em todos os lugares, observando os passos e atitudes de quem passa. “A sociedade em que vivemos fará cada vez mais o uso de tecnologias para monitorar o comportamento”, prevê o sociólogo Antônio Flávio Testa, pesquisador da Faculdade de Educação da UnB (Universidade de Brasília).

As escolas não poderiam ficar de fora dessa tendência. Para oferecer mais segurança a seus alunos, tranquilizar pais ou mesmo cuidar do patrimônio e coibir a violência, muitos estabelecimentos utilizam os equipamentos que hoje fazem parte da rotina escolar. No estado de São Paulo, a Secretaria de Educação prevê a instalação de 11 mil câmeras em 2,2 mil estabelecimentos de ensino da capital e da Grande São Paulo. A medida foi anunciada após casos de revolta dos alunos em escolas do estado, com violência e danos ao patrimônio. As imagens serão monitoradas por uma central que pode acionar órgãos de segurança caso haja algum tipo de ocorrência.

Medidas como essa despertam polêmicas e debates entre professores, alunos e a direção das unidades de ensino, especialmente quando o assunto é privacidade. Mas para a psicopedagoga Maria Irene Maluf, não há outra saída. “Em muitos colégios, as câmeras já não são mais novidade há muito tempo. Há câmeras por todos os lados, vivemos em um mundo monitorado. O que entra em questão é pensar que elas servem para a nossa proteção e não como uma forma de coibir”, aponta.

Segurança e proteção
Uma escola de Londres, na Inglaterra, instalou 100 câmeras para monitorar seus alunos e professores. Os equipamentos foram colocados em corredores, playgrounds, áreas de refeição e até em salas de aulas, e centenas instituições de ensino do país estão adotando a mesma medida.

No Brasil, câmeras de segurança já foram instaladas em cerca de 50 escolas públicas da rede estadual do Amazonas, localizadas em regiões com altos índices de violência. Segundo o secretário de educação, Gedeão Amorim, o principal objetivo é reduzir os frequentes danos ao patrimônio público. E o efeito tem sido positivo: “As escolas eram muito ‘arrebentadas’ e isso melhorou muito. As câmeras inibiram certos tipos de comportamentos violentos”, conta o secretário.

Os colégios estão recebendo os equipamentos aos poucos. “Cada vez que é preciso fazer uma intervenção de engenharia em uma unidade, aproveitamos para instalar as câmeras”, explica Gedeão. Ainda não há uma central de monitoramento, mas as imagens ficam arquivadas para futuras consultas. Segundo o secretário, a comunidade recebeu bem a novidade e “não há registro de insatisfações”. “Quando a gente cuida da escola, a meninada se orgulha dela”, acredita.

Salas de aula e banheiros não entram no circuito de monitoramento que se restringe às áreas comuns, como pátios e corredores. “Os professores poderiam se sentir intimidados”, prevê o secretário. Ainda que o assunto provoque polêmica, Gedeão defende que o Estado precisa manter sob controle os serviços que oferece e garantir a conservação do patrimônio. “Se por um lado pode ser constrangedor, por outro é necessário. Hoje somos vistos por todos os lados”, afirma.

“Big Brother” na aprendizagem
Na avaliação da psicopedagoga Maria Irene, o uso das câmeras não traz prejuízo à aprendizagem ou à rotina escolar. “Existe uma dose em que essa medida não é prejudicial. Se o uso for feito com bom senso, havendo uma justificativa, a criança aceita e até esquece que as câmeras estão ali”, afirma. Dentro da comunidade escolar, ela acredita que o professor é o mais afetado. “É mais fácil inibir o professor do que o aluno, porque é ele quem está sendo sempre observado. Mas, com o tempo, isso passa a ser uma coisa até natural”, acredita.

Entretanto, para o Sinpro-DF (Sindicato dos Professores do Distrito Federal), as câmeras podem sim afetar a dinâmica dentro de sala de aula. “O professor tem a maturidade para lidar com isso, mas o aluno pode se podar porque sabe que está sendo observado. Uma coisa é fazer uma pergunta diante de seus colegas, outra é saber que tem uma câmera vigiando. Pode comprometer a espontaneidade do aluno, uma coisa que é tão importante e que enriquece as aulas”, defende a diretora jurídica do sindicato, Rosilene Correa.

Ela destaca ainda que o sentimento de estar sendo constantemente observado pode incomodar o professor. “O ambiente de sala de aula é construído entre professor e alunos. Cria-se uma intimidade que fica exposta com as câmeras. Não é que sem o monitoramento o professor vá cometer ações incorretas, mas elas podem gerar um desvio de atenção”, diz.

Para o sociólogo Antônio Flávio Testa, na análise do custo-benefício, a medida é mais positiva do que negativa. “Você consegue ter um controle maior do problema da segurança, da preservação do patrimônio. Mas acho que também ajuda o professor a melhorar a qualidade da aula, controlar a disciplina da turma. Uma vez que todos são monitorados, terão que apresentar um comportamento mais adequado e também o professor terá que melhorar a qualidade do seu trabalho”, avalia.

A coordenadora da Escola DNA conta que logo que as câmeras foram instaladas alguns profissionais ficaram ressabiados, mas em uma semana todos se adaptaram e “nem lembram que elas estão aí”. “Eu não me sinto vigiada, mas acompanhada. As câmeras passam a fazer parte do nosso dia a dia. Temos bons profissionais e estamos super seguros nesse aspecto. Elas são uma espécie de transparência. Acho que quem não deve, não teme”, diz Renata.

Antônio Flávio avalia, entretanto, que as câmeras só serão úteis se o sistema for bem gerenciado. A escola precisa pensar na manutenção dos aparelhos e até mesmo na forma de arquivar os vídeos. Outro ponto crucial é definir um regimento interno para o uso dessas imagens. Para Rosilene, se as câmeras forem utilizadas pela escola como “controle de qualidade” do trabalho do professor, essa atitude pode ser considerada como “violência”. “Esse material não pode ser utilizado indevidamente para assédio moral. Nesses casos, o professor deve recorrer aos seus direitos”, recomenda o sociólogo.

O pesquisador da UnB destaca que ainda não existem limites jurídicos sobre o assunto. “Isso se tornou um problema político. Qual é o limite para que as empresas e os estados possam intervir na vida das pessoas? Essa é uma questão ainda não resolvida. O Congresso Nacional já começa a discutir isso, mas ainda levará muitos anos”, diz. Para que as câmeras sejam utilizadas da melhor forma possível, ele recomenda o diálogo. “É importante que as escolas discutam isso internamente com as famílias, os professores e os alunos. Como tudo ainda é muito novo, a medida pode surgir de uma forma autoritária”.

Rosilene aponta que as medidas de segurança são sempre bem-vindas, mas defende que só as câmeras não serão suficientes para resolver o problema da segurança. “As medidas tomadas de forma isolada pelos governos não vão resolver o problema. Podem até passar um clima de mais segurança para quem trabalha no ambiente escolar, mas não resolvem. Elas precisam fazer parte de um conjunto de ações e propostas para evitar a violência, incluindo políticas públicas”, avalia.

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quarta-feira, 4 de novembro de 2009

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